quinta-feira, 5 de julho de 2007

Réplica a José Reis Santos, a propósito do Arquivo Municipal de Lisboa

Caro José Reis Santos,
Respondo-te como munícipe, historiadora e arquivista ao teu post de comentário ao meu anterior.
Ponto prévio: ao contrário do que afirmas, entendo que, nas políticas cultural e da informação da CML, a reabertura do Arquivo Histórico Municipal é uma prioridade absoluta. Trata-se da memória organizacional do Município e social da cidade, é o acesso público a um dos mais importantes arquivos do país que está em causa.
Pegando no teu repto, ultimamente não temos assistido a grande interligação entre a Universidade e a História Local de Lisboa e percebe-se porquê. A maioria do acervo do Arquivo Municipal de Lisboa (AML) está inacessível ao público (estudantes, professores e investigadores das universidades incluídos) há quase cinco anos. Podem fazer-se trabalhos de pequeno fôlego só com base em fontes impressas, mas trabalhos de maior envergadura exigem a consulta de fontes de arquivo. A impossibilidade de aceder às fontes primárias do AML tem impedido a realização de estudos académicos sobre a História Local de Lisboa.
Há cerca de dois anos encontrei num Congresso um historiador da Faculdade de Letras que costumava participar nos colóquios temáticos organizados pelo Arquivo Municipal de Lisboa; disse-me que já não sugeria aos alunos temas de trabalho ligados à história de Lisboa porque o Arquivo estava fechado e os colóquios nunca mais se tinham realizado.
Uma melhor interligação entre a Universidade e a Autarquia no que toca aos estudos sobre Lisboa passa primeiro pela resolução do problema do acesso à documentação. É com espanto e tristeza que vejo que os historiadores mais influentes da nossa praça, em vez de exigirem a reabertura do Arquivo, desistiram de estudar Lisboa.
Depois, há que apostar no estabelecimento de parcerias e protocolos. A definição de prioridades no que respeita ao tratamento documental, à disponibilização de descrições e reproduções online, etc., poderia tomar em linha de conta as agendas de investigação. Lamento que não haja em nenhuma universidade lisboeta um centro de investigação interdisciplinar sobre questões transversais à Cidade.
Quanto ao financiamento, já em diversas ocasiões afirmei que “tal como os químicos, os físicos, os biólogos, etc. necessitam de laboratórios bem apetrechados para desenvolver a sua investigação científica, também os historiadores (e outros cientistas sociais) dependem da existência de arquivos em boas condições de conservação, acesso e comunicação. A salvaguarda, a descrição e a divulgação de milhões de documentos do nosso passado exigem, à semelhança dos laboratórios científicos, financiamentos avultados. Sem arquivos acessíveis aos investigadores não há conhecimento histórico. Sem conhecimento histórico não haverá cidadania plena”. Concordo plenamente que as Universidades e a Autarquia, no caso em análise o AML, podiam apresentar projectos conjuntos à FCT e a programas europeus.
A pós-graduação da UAL foi, de facto, uma ideia feliz. Assisti com gosto a grande parte das aulas da primeira edição. Hoje, no quadro do processo de Bolonha, o modelo da pós-graduação já não faz sentido. Mas um Mestrado em Estudos Olisiponenses, numa perspectiva multidisciplinar, faz falta e teria procura. Tal como uma “escola” de formação contínua.
Por motivos profissionais, não me pronuncio sobre o trabalho desenvolvido por serviços da CML. Digo apenas que o futuro está na cooperação entre todos, tendo sempre em vista o interesse do cidadão.

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