quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Barcelona e a Utopia

Não conhecia ainda Barcelona, e suponho que após uma mísera meia-dúzia de dias continuo a não conhecer. Ainda assim no meu desconhecimento fiquei com muito boa impressão, mesmo se as expectativas já eram altas. Uma cidade onde a boa arquitectura está por toda a parte, não apenas Gaudí (mas também, obviamente). São tantos os palacetes que parece ser um direito fundamental de qualquer cidadão viver num, é a democratização da habitação em estilo. Mais ainda, é uma cidade onde o povo mora dentro da cidade e o interior da cidade é habitado. Nem há prédios devolutos a cada esquina nem as classes média e baixa são corridas para os subúrbios. No Raval convivem imigrantes com alternativos, uns e outros são parte da cidade, não uma pitoresca excepção, apenas simples residentes normais. Sem grande surpresa é onde se encontram mais movimentos criativos. E como cenário Grafittis que pintam as paredes dos prédios antigos de bairro popular, são também parte agora normal da paisagem. Ao lado as Ramblas descem até ao mar, onde a docas estão feitas para os peões, e para os vendedores clandestinos que passam a vida a fugir à frente da polícia (têm até umas trouxas já preparadas para pegar e fugir a todo o instante). A Barceloneta, que foi bairro de pescadores, acaba no areal, em plena cidade. Não é preciso ir longe para pegar uma praia. O metro parece feito para optimizar ao máximo o aproveitamento do espaço, um lanço de escadas e está-se no cais, um túnel e está feita a correspondência. Simples e eficaz, e cobre a cidade toda. Também já há bicicletas de aluguer. O porto - que é grande - não está à frente da cidade a tapar a vista para o mar, está ao lado. Está assim como quem se desvia de propósito para não incomodar.
E como seria de espera (digo eu...) numa cidade destas há gente, muita gente, há vida, há movimento. Qual Lisboa, qual Paris... Ainda alguém tem dúvidas sobre o porquê de Barcelona ser a cidada da moda?

3 comments:

Daniel Melo disse...

É triste ler o teu post e ter que admitir o contraste entre cidades que nos são queridas, sobretudo no respeitante à fixação das diferentes classes e grupos sociais no interior do núcleo urbano.
Ainda assim, quanto a Barcelona, gostava de deixar aqui uma questão:
a parte nova, onde estão todas aqueles arranha-céus e torres que fazem as delícias das páginas de lazer da imprensa mainstream não será já demasiado fora das vivências urbanas e mais para os arquitectos brilharem como mega-escultores?
Ou seja, para as elites brilharem em público, esquecendo os habitantes das cidades, as suas necessidades, a memória social e urbana, e a arquitectura paisagística?

Zèd disse...

Daniel,
Não fiquei com essa impressão. O único arranha-céus que se sobressai é a torre do Jean Nouvel (bem feinha por sinal), mas fica relativamente longe do "centro", a zona do Bario Gotic, Ramblas, Raval, Barceloneta, Eixample. Mas a verdade é que não fui muito para essa parte nova de que falas, não sei como são as coisas por lá...

Daniel Melo disse...

Zèd,
para que não restem dúvidas, eu tb. gosto de Barcelona, do centro de que falas, do Montjuic, etc..
Já não vou à bola é com a mania cada vez mais insinuante de se impor a cidade (em altura, em volumetria, etc.) pela visão supostamente iluminada de uns quantos.
Ou seja, só é cidade moderna aquela que constrói em altura (ou que tem edifícios de escritórios com vidros escuros, etc.), independentemente da história urbana das cidades em concreto, das aspirações e necessidades das suas populações, dum urbanismo discutido e participado.