sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Chama-se a isto cultura "amori"

Rendre hommage a 'womenageatrois'

Meu querido mês de agosto

Hoje é o último dia do mês das férias. Deixo-vos um clássico do já desaparecido Dino Meira, para recordar este e outros Verões. Agora, só daqui a um ano voltaremos a ser Agosto. Já tenho saudades!

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

A marcha das tartarugas*

Em todo o mundo, há só 3 lugares que as tartarugas da espécie Caretta caretta escolhem para pôrem os ovos. Em Cabo Verde, algumas praias do arquipélago recebem esses doces animais que chegam rapidamente ao areal no embalo das ondas do mar. Iludem até o facto de, em geral, fazerem tudo «a passo de tartaruga».
A revista Visão desta semana [1] refere-se a um projecto-piloto de protecção das tartarugas que envolve investigadores da Universidade do Algarve e técnicos de Cabo Verde, em parceria. Uma das medidas mais visíveis para se evitar a matança das tartarugas inclui a presença de militares com metralhadoras(!) para vigiar as praias mais procuradas pelos animais. Solitários ou em duplas, estes militares procuram conter os caçadores furtivos que insistem em interromper a lenta actividade em terra. Esta medida pretende deter a matança e garantir que o investigador da Universidade do Algarve possa estudar e filmar todo o processo até ao momento em que as tartarugas regressam sã e salvas ao mar. A missão dos militares está rodeada de obstáculos, entre os quais destaca-se a frequente proximidade (por laços de parentesco, de amizade ou de vizinhança) que os liga aos potenciais caçadores.
É fácil de compreendermos o desconforto e o conflito de um vigilante da lei, preso entre as relações sociais actuais, o dever de militar, a satisfação de proteger as tartaruguinhas e as memórias de um tempo que o fazem conhecer tão bem todos os passos que são dados para se chegar às tartarugas e aos seus ovos.
Lemos no artigo que a sensibilização das comunidades piscatórias (e não só) para que se tornem os "vigilantes da natureza" fica para o próximo ano. É de se supor que quando começar a intervenção para a mudança comportamental teremos mais um elemento para eliminar do imaginário popular: as imagens já formadas em que tartarugas aparecem automaticamente associadas a militares com metralhadoras!
Os dois técnicos cabo-verdianos envolvidos na protecção das tartarugas adoptam atitudes corajosas e abnegadas, como a de percorrer o areal e dissimular os vestígios das desovas para impedir que os ovos sejam descobertos. Além disso, e como nos dá a conhecer o artigo, todos negam gostar de carne de tartaruga.
Por todos estes factos, e porque não temos dúvidas de que as comunidades são as únicas que podem garantir a protecção das tartarugas, a longo prazo, sugestões devem ser apresentadas. Adiantamos algumas:
- convencer os gulosos (podem preservar a verdadeira identidade) que a carne da tartaruga é assim tão saborosa porque contém um dos principais elementos responsáveis por uma doença mortal contemporânea;
- descobrir quem é o responsável pela escassez crescente do atum nas águas de Cabo Verde;
- convencer os homens (com terapia, se necessário) a abandonar a crença de que a ingestão daquela parte do corpo da tartaruga traz ganhos à performance no acto sexual.
Ou, talvez, optar pela seguinte alternativa: apressar a marcha das tartarugas de volta ao mar!
Nb: para mais informações vd. WWF.
___
[1] vd. Fernando Peixoto, "A matança das tartarugas", Visão, n.º 755, 23/VIII/2007, p. 88.
*Iolanda Évora

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Final de Agosto em beleza

É só para dizer que já estamos na Liga dos Campeões, após um golaço de antologia.
Agora só falta sair-nos um grupo acessível, e que o SLB consiga consolidar uma equipa. Porque entrega já se viu, num jogo mais suadito que bem jogado, muito por culpa do adversário.
Boa sorte ao mister Camacho e sua equipa!

terça-feira, 28 de agosto de 2007

A vez do peão honorário: Nelson Évora


Nelson Évora, peão honorário, de egrégios avós.

domingo, 26 de agosto de 2007

Vinhos de Palmela são bons p'ra ele e p'ra ela

À boleia da crítica de José A. Salvador na Visão da semana passada, aproveito para vos falar dum tipo de vinhos que é cá do agrado da casa: refiro-me aos vinhos de Palmela.

Nestes, há um produtor que se tem vindo a destacar, a Casa Ermelinda de Freitas.
É uma empresa vitivinícola familiar, que em poucos anos saltou de pequeno fabricante de vinhos a granel para um caso de sucesso, com vinhos muito competitivos e apostando em preços médios. Os principais críticos renderam-se-lhe, destacando a boa relação qualidade/ preço patente na maioria dos seus vinhos.
Dos seus 130 hectares de vinha, 100 são dedicados à casta Castelão, também conhecida como Castelão Francês, Periquita ou João Santarém. O Castelão é uma casta tinta elegante, não muito encorpada, com aromas a baunilha e frutos silvestres (em especial, a mirtilho).
Dos que têm Castelão, gosto e costumo comprar o Terras do Pó (seja o corrente, seja o reserva) e, por vezes, o Dona Ermelinda. Vários apreciadores destacam o seu Quinta da Mimosa, que em anos de boas colheitas origina o Leo D'Onor (sendo este caro, embora muito apreciado). Tudo vinhos premiados, tanto a nível nacional como internacional.
Quanto às 3 novas apostas varietais (Alicante Bouschet, Syrah e Touriga Nacional) sugiro a leitura dum post de José Teófilo Duarte reproduzido aqui.
Nos brancos, a região dedica-se muito às castas Fernão Pires e Moscatel, e esta casa tb. tem boa oferta nesta gama (nos mais acessíveis, e combinando ambas as castas, está em alta o Fonte do Nico, da Cooperativa Agrícola de St.º Isidro de Pegões).
Na região há outros bons produtores, Salvador destaca ainda um Verdelho especial da Coleção Privada do Domingos Soares Franco, além da Bacalhoa Vinhos, que tem 2 excelentes vinhos: o tinto Má Partilha (um Merlot guloso mas caro) e o branco Moscatel (a bom preço e gostoso). Então, boa conversa e bons vinhos!

sábado, 25 de agosto de 2007

EPC no fio do horizonte (1944-2007)

Apesar do seu lado mais convencional e do pendor para o ‘amiguismo’, vou ter saudades de Eduardo Prado Coelho e dos seus textos de ensaio e crónica jornalísticos, designadamente de «Fio do horizonte», aquele que foi o seu espaço de crónica no jornal Público nos últimos 10 anos.
É verdade que EPC nunca se preocupou em fazer uma crítica literária (ou outra) assente na sistematização da qualidade das obras saídas. A sua opção pela escrita sobre autores e obras que agradavam ao seu gosto pessoal, quantas vezes seus amigos pessoais, não é em si mesma negativa. Contudo, o meio da crítica perdeu assim um dos nomes que mais poderia incentivar essa busca por uma sistematização, essa necessidade duma maior procura da qualidade e das insuficiências e limites das obras. Dum inventário mais plural baseado na qualidade, no risco e na experimentação.
Seja como for, é inegável o seu impressivo contributo para o ensaísmo jornalístico, para uma maior informalidade na crítica e para uma certa saída das torres de marfim. Articulou, como poucos por cá, a análise de distintas áreas do saber: poesia, romance, fotografia, artes plásticas, cinema, política, filosofia, etc.. Ajudou a divulgar e a consagrar vários artistas, escritores e iniciativas. Fez bastante pelo debate público, com ideias e argumentos, num país pouco dado a ele.
Ultimamente, as crónicas de que gostava mais eram aquelas em que se detinha a comentar aspectos do nosso quotidiano social e cultural.
Porque nos ajudou a pensar a nossa contemporaneidade, aqui fica o meu reconhecimento.
Nb: vd. obituário informativo aqui.

Justiça igual para "The Jena Six"

O blogue No cesto da Gávea dá-nos conta com detalhe do caso “The Jena Six”, recentemente objecto de uma reportagem da Antena 1, a que aludi num post demasiado breve.
Entretanto, Pedro Azevedo Peres (autor daquele blogue) enviou-me uma mensagem que subscrevo inteiramente e passo a transcrever:
«Venho convidar-vos a subscreverem uma petição exigindo Justiça Igual para "The Jena Six" e a promove-la junto dos vossos amigos e contactos, e através das vossas colunas, blogs e sites.
Trata-se de um caso vergonhoso, um recuo de meio século nos Direitos Civis e Humanos, quando se transforma uma briga de escola, entre adolescentes, em crime de agressão agravada e de conspiração, e onde para sustentar tal acusação se transforma um par de ténis em arma de crime.
O jovem estudante branco que foi agredido, em resposta a repetidas provocações que lançou, e num contexto de tensão racial que já se arrastava desde há já alguns meses, teve apenas leves escoriações, que não o impediram de frequentar nesse mesmo dia um evento social;
Os 6 jovens estudantes negros, que presumivelmente o agrediram, foram de imediato presos e confrontados com uma acusação de homicídio tentado, que o Acusador Público, sem sustentação para uma acusação tão grave e não tendo conseguido que os incriminados se dessem por culpados, até ao primeiro julgamento, o do jovem Mychal Bell, alterou no último minuto para agressão agravada, com conspiração.
O jovem Mychal Bell, à data do “crime” com 16 anos, foi “julgado” perante um júri de brancos, – numa comunidade multiracial não ter na sua constituição nem um representante de uma minoria é obra – foi considerado culpado e espera que o juiz lhe decrete a respectiva sentença, que pode ir até 22 anos de prisão.
Podem ler a história, desde a sua génese – o direito de todos usufruírem da mesma sombra de um carvalho existente no pátio da escola – até à sua última actualização, publicada na Newsweek desta semana, em:
http://www.msnbc.msn.com/id/20218937/site/newsweek/page/0/
“A Town in Turmoil”, by Gretel C. Kovach and Arian Campo-Flores, Newsweek, Aug. 20-27, 2007 iss.
Poderão encontrar outras fontes e contactos em:
http://gajeiro.blogspot.com/
E finalmente poderão subscrever a petição em:
http://www.ipetitions.com/petition/JenaSix/index.html
N.B.: Esta petição foi criada apenas porque se tornava impossível subscrever outras já iniciadas nos EUA, ou porque se destinam expressamente a cidadãos americanos, ou a aí residentes, caso da petição da NAACP, que entendemos seguir o modelo e onde apenas alterámos a palavra “citizens” por “humans beings”.
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sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Vem aí a nova caderneta do Peão! Coleccione já!!

É verdade, amiguinhos. Sempre na senda da inovação, aí vem mais uma novidade, a caderneta de cromos Peão 2007/2008!
Inovadora? Sim, é muito simples: depois de tantas cadernetas a listar homens felpudos de mangas arregaçadas e vestuário inestético, eis que temos o prazer de vos anunciar a caderneta de cromos dedicada a uma categoria de homens que, se sabe bem vestir, ainda melhor se sabe pentear e bigodar.
Mas, atenção! Para este campeonato não é qualquer clube que tem arcaboiço, ah, não. Só os melhores. Como o nosso querido SLB, pois não é verdade.
Coleccionáveis Peão, é uma danação!
E reparem no detalhe precioso: há sempre novos cromos a sair quando menos se espera, por isso é coisa para dar para várias cadernetas. Várias? Sim, incrível, não é? Ah, pois é. Como é kisto vai acabar? E eu sei? Acaso sou profeta?! Eu, hein...











quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Festa na Cidadela*

ou Angola versus Cabo Verde no AfroBasket 2007

Hoje, Luanda é festa, na certa. Às 20:00 começa um dos jogos das meias-finais do AfroBasket[1] 2007, entre Angola e Cabo Verde. Prevê-se lotação esgotada na Cidadela, com torcida maioritária de orgulhosos angolanos ou angolanos orgulhosos (o que neste momento é a mesma coisa) porque a equipa tem correspondido ao favoritismo que lhe fora apontado desde o início. Mas já sabemos (e os angolanos também) que vamos contar com a presença significativa de torcedores da equipa de Cabo Verde, imigrantes que têm se esforçado por acompanhar e apoiar os rapazes vindos do arquipélago. Como sempre acontece, a comunidade de cabo-verdianos em Angola deu uma mãozinha aos jogadores para colmatar as deficiências de uma estadia que as autoridades desportivas do arquipélago nunca asseguram a 100% (excepto, talvez, quando se trata do futebol). Assim, entre abraços, cachupas, e funges também, é claro, os acarinhados rapazes acabaram por sentir-se em casa, em Angola, e protagonizaram duas das maiores surpresas do campeonato: estão nas meias-finais, e pelo caminho, derrotaram a Nigéria, a poderosa equipa de sempre do basquetebol em África.
O comentário geral é o de que, neste campeonato, à excepção da equipa anfitriã, as “grandes” do basquetebol masculino do continente tiveram um fraco desempenho e estão irreconhecíveis. Para a imprensa africana[2], as derrotas das grandes provam que o basquetebol em África está em crise. Mas não dizem o que provam as vitórias das pequenas, em relação à expansão da modalidade em África. Na Nigéria, os media continuam a falar da hecatombe da sua selecção (www.asemana.cv) e a imprensa que cobre o AfroBasket 2007 ainda se mostra muito mais surpreendida com a derrota da Nigéria do que com a vitória de Cabo Verde.
O que importa é que hoje tem festa na Cidadela! Angola já ganhou de Cabo Verde (por uma grande diferença de pontos) da primeira vez em que se enfrentaram neste campeonato. Para o certame de hoje, a superioridade da equipe é por demais evidente, mas depois da derrota da Nigéria/ da vitória de Cabo Verde, a prudência manda guardar para si as certezas sobre as fraquezas do adversário em campo. Hoje, os jogadores angolanos, favoritos em campo, devem temer muito mais as fraquezas que costumam derrubar os fortes como eles em pleno voo (literalmente no basquetebol) e que deixaram o gigante Nigéria pelo caminho.
Mas vamos ter festa nas bancadas porque nos 4 períodos de duração de jogo, o gigante não será ameaçado, o fraco continuará orgulhoso dos seus próprios feitos. Afinal, o semba nunca brigou com a coladeira, nem a kizomba com o funaná ou o kuduro com o batuque.
[1] A ausência da qualificação do género costuma “indicar” que se trata do campeonato masculino.
[2] A imprensa, em geral, não deve ter sido informada de que está a decorrer este campeonato.
* Iolanda Évora

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Revista moderna renova pneu usado

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A edição de amanhã do L'Express mostra-nos que o trabalho de controlo da imagem não pode ser deixado a amadores. Profissional mesmo é ter quem dê um toquezinhos com photoshop para, nos palcos que contam, eliminar o estival pneu. Se não, vejam as fotografias acima. À esquerda, temos o pneu de Nicolas Sarkozy retratado nas recentes férias nos States (foto N.Hamberg/Reuters). À direita, a mesma foto publicada pela revista Paris-Match de 9 de Agosto passado. O proprietário de Paris-Match, a famosa revista people, é Arnaud Lagardère, amigão de Sarkozy.

Quais wikipédias, meus amigos: só quem é do ramo percebe as manhas, os equívocos, os vícios e também as potencialidades do sector.

Quando a língua não é a nossa pátria*

Quando foi feito, em 1990, o acordo da reforma ortográfica do português previa a ratificação de todos os países da CPLP para entrar em vigor. Porém, em julho de 2004, devido a dificuldade de alguns membros em conseguir aprová-lo, foi decidido, em um encontro em São Tomé e Príncipe, que bastariam apenas três países conseguirem a ratificação em seus Congressos para que o acordo entrasse em vigor. O Brasil ratificou em 2004, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, respectivamente, em fevereiro e dezembro do ano passado.
O problema é que até agora Portugal tem se mostrado resistente à unificação ortográfica. Alega, entre outras coisas, que tem sido pressionado pelas grandes editoras portuguesas que têm medo de competir com as brasileiras. Argumento que não engulo, pois apesar da eterna crise em que vive mergulhado o mercado editorial brasileiro, muitas editoras estrangeiras estão se instalando aqui em busca de melhores resultados financeiros. A espanhola Santillana, que já é dona da Moderna (especializada em livros didáticos), comprou 75% da Objetiva. Da Espanha também vieram a Planeta e a Oceano. Os franceses também não perderam tempo. Caíram aqui de mala e cuia com a Larousse e a Vivendi, que comprou a Ática e a Scipione. Em suma: existem pelo menos 10 editoras estrangeiras operando no país e entre as sete maiores, cinco são estrangeiras. E não há qualquer entrave legal para que as editoras lusas venham pra cá abocanhar uma fatia de mercado, que apesar de ter apenas 25% (45 milhões – ver dados completos – e lamentáveis - abaixo[1]) de sua população de 180 milhões de habitantes com capacidade de ler textos mais complexos, chega a ser muito mais viável economicamente que a maioria dos países da União Européia.
Como se pode constatar, os editores portugueses não precisam temer as editoras brasileiras mas sim as estrangeiras, principalmente as espanholas. Por isso, acredito eu, a hesitação do governo luso em ratificar o acordo não passa pela questão econômica ou mercadológica. Na verdade, Portugal não quer é mesmo se render ao seu conservadorismo linguistíco, pois será o país que mais terá de se adaptar à reforma ortográfica propostas pelos signatários do acordo.
Eu, particularmente, gostaria que a discussão dessa reforma não se limitasse apenas e tão somente a questões econômicas e mercadológicas, mas que servisse de reflexão pra se corrigir as injustiças sociais que existem nos países membros da CPLP. É um exercício de pura ficção imaginar que haja unificação de uma língua quando a exclusão social tira o direito do indivíduo de acesso pleno à educação e a outros meios culturais. Também não podemos deixar de considerar as diferenças culturais e linguísticas que existem nos países lusófonos da África, que têm em sua língua materna o seu maior meio de comunicação entre os seus iguais. Por fim, os dados abaixo confirmam que pouca diferença fará uma reforma ortográfica aqui no Brasil. Eles servem de exemplo também de como poderia ser mais rentável (se esse é o caso) se nos países lusófonos a educação fosse uma prioridade de seus respectivos governos. Só poderemos afirmar que a língua é nossa pátria quando o analfabetismo for totalmente erradicado. Caso contrário, teremos sempre duas pátrias coexistindo num mesmo território onde o conceito de Pátria vai por água abaixo. E esse é o caso do Brasil.
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[1] Segundo o Indicador Nacional de Analfabetismo Funcional, obtido a partir de pesquisa da ONG Ação Educativa, em 2003, 8% da população brasileira, com idade entre 15 e 64 anos, é analfabeta, e c. 30% não conseguem localizar informações simples em uma frase. Outros 37 % só localizam informações em texto curto. Já os que conseguem estabelecer relações entre textos longos somam apenas 25%.
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* Manolo Piriz

À sombra do racismo

Oiço, incrédula, no programa da manhã na Antena 1: Na escola secundária de Jena (Louisiana, EUA) só os brancos se podiam sentar à sombra de um frondoso carvalho. Quando essa espécie de tradição foi posta em causa, explodiu a violência racial entre jovens daquela escola. Entretanto, o carvalho foi arrancado e os seus troncos queimados.
Continuamos sem saber lidar com o racismo!

terça-feira, 21 de agosto de 2007

O caso do milho transgénico: causas e excessos

Sobre o caso da manifestação contra o milho transgénico na propriedade dum pequeno agricultor, subscrevo por inteiro o post «O elo mais fraco», de Daniel Oliveira, no Arrastão.
A associação envolvida, o Movimento Eufémia Verde, devia assumir os erros cometidos e reparar os danos provocados ao agircultor. Independentemente da necessidade dum debate público sobre os produtos transgénicos.
Também nem a direita, nem o governo (a seguir), estiveram bem em usar este caso como mera trica partidária. Porque não aproveitar para debater a questão relevante das vantagens e perigos dos transgénicos? Quanto ao resto, a polícia tem na posse os dados para averiguar e eventualmente apontar eventuais ilegalidades, que os tribunais julgarão oportunamente.
Nb: imagem da tradicional «malhada do milho» retirada daqui.

De Férias (ou o meu país visto de fora)

- Ah!, par moments j'aime bien les embouteillages.
- ...!?!?!?
- Ici, je veux dire.
[Nota: referindo-se ao cantinho à beira-mar plantado]
- Comment ça?
- Bah oui, on roule beaucoup moins vite!

domingo, 19 de agosto de 2007

João Vário (1937-2007)

Faleceu a semana passada um dos maiores poetas cabo-verdianos de sempre, João Vário. De seu nome verdadeiro João Manuel Varela, nasceu na Cidade do Mindelo (S. Vicente) há 70 anos atrás, tendo estudado Medicina em Coimbra, Lisboa e Antuérpia, nesta última para se doutorar.
Radicou-se na Bélgica, onde desenvolveu uma bem sucedida carreira de investigador nas áreas da neuropatologia e neurobiologia, sendo sua a descoberta dum circuito cerebral ligado à formação do cancro (vd. síndrome de Varela). Após a jubilação, regressou ao seu Mindelo natal.
Embora com uma obra poética reconhecida por pares e críticos literários (José Luís Tavares diz mesmo que ele é o maior poeta cabo-verdiano de sempre), nunca teve muito eco, nem junto dos circuitos de reconhecimento simbólico nem junto do público.
A sua profícua produção está integrada nos seguintes livros:
Exemplos 1-9 (reunindo as obras Exemplo Geral, Exemplo Relativo, Exemplo Dúbio e Exemplo Próprio), O primeiro e o segundo livro de Notcha (com o seu outro pseudónimo Timóteo Tio Tiofe), Contos da Macaronésia e O estado impenitente da fragilidade.
Mais informação bio-bibliográfica e mais poemas do autor estão na memória de áfrica. Ficam aqui outros obituários: os de José Luís Tavares (que inclui um poema seu de homenagem), Alexandra Lucas Coelho, Rui Bebiano e José Francisco Viegas. Outro poema, «Canto Terceiro», de 1966, pode ser lido aqui. Imagem original daqui.
Aqui fica um excerto precioso do poema Canto Primeiro, do livro Exemplo coevo:
"E aqui tratamos de favores inclusivos e fados determinados.
Tal o poeta a língua deixa atravessada
no meio do caminho dos deuses
para que nela tropecem
e se fale de biografia. E de tal intensidade vivemos.
[...]
É um tempo de vastas corrupções e de grandes crises.
E as coisas aguardam a chegada da besta apocalíptica.
Era o limiar dessa guerra devastadora, segunda,
seu amargo prefácio, tal Guernica.
E nela jazíamos qual a semente
no seio da terra: como saber
se morrerá ou com que água
arrastará a imortalidade?"

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Banalizar ou trivializar a historia (outra vez).


Ola a todos/as:

Hai xa demasiado tempo que non paseo polo peao. Agora vou de acó para aló, de carro - aínda que non conduzo nin aspiro a ocupar un alto cargo - de tren (lento), de avión (low cost), de autocarro (ateigado) ou, por sorte ultimamente, de bicicleta (regalada, como as dos nenos) . A maiores, estou de vacacións. A alimentación dos meus circuitos neuronais está parada, tamén por fortuna para min e, sobre todo, para aqueles que me rodean. Nembargantes, nos primeiros días das feiras, continuaba co mal vicio de comprar (e até de ler na praia) o xornal. Por fortuna, xa fun quen de deixalo.


Naqueles tempos, hai uns dez días, unha noticia chamoume a atención e fíxome reflexionar - en graos pouco profundos - acerca dun asunto sobre o que xa colguei noutra ocasión un post no noso caro peao. A saber, a banalización da historia, da que na España se está a encargar - entre outros medios de comunicación - unha canle de TV privada (Tele 5) que periodicamente emite programas sobre o lado máis "rosa" ou "amarelo" de personalidades da nosa historia recente, de Adolfo Suárez, primeiro presidente da nosa actual democracia constitucional, ao "generalísimo" Francisco Franco.

Pois ben, a imaxe que me golpeou, nesta mesma liña, foi a de Mijail Gorbachov sentado no asento de atrás dun coche de luxo e xunto a unha bolsa de viaxe da "popular" marca Louis Vuitton, esa mesma que patrocina competicións de deportes tamén "populares" como por exemplo a "Copa do América" de vela. De fondo, aquí ven o terrible, os testemuñais (e tamén turísticamente banalizados) restos materias do muro de Berlín que, suponse, aínda que dubido que este fora un obxectivo consciente da súa vontade política a mediados da década dos 80, "axudou a derrubar" o propio Gorbachov.

É imposible ollar para unha foto como esa e non sentir un pouco de embarazo ou de incomodidade. Xa non é que Gorbachov se teña convertido nun pseudo icono pop da mercadotecnia capitalista ou que Lenin, mesmo embalsamado, fora quen de levar as mans á cabeza, non. Viñéronseme á mente os milleiros de persoas que morreron intentando atravesar ó muro cara á República Federal Alemana, as familias separadas e divididas durante décadas, as vítimas da "stasi" da RDA, a tensión psicolóxica na que millóns de persoas en todo o mundo viviron como consecuencia da ameaza nuclear durante a Guerra Fría...

Coa súa colaboración, co seu toque de modernidade snob, Gorbachov púxose un pouco ao mesmo nivel que os Beckam, que o final van ser verdadeiros líderes mundiais e uns auténticos visionarios. Levará nesa bolsa de viaxe Gorbachov uns calzoncillos da marca Calvin Klein? Eu apostaría que si... A s novas xeneracións non saberán nada nin da Perestroika, nin das manifestacións e protestas dos grupos opositores que levaron o desartellanto da dictadura comunista soviética e do Partido Comunista da URSS, nin do golpe de Estado frustrado do verán de 1991, nin nada de nada sobre quen foi históricamente Gorbachov, máis aló dun señor que anunciaba bolsas de viaxe pijas, posh, quecks (se se escribe así) ou como raio se queira dicir...

Para completar o cadro, a foto en cuestión foi feita por unha reputada fotógrafa, precisamente especializada na fotografía das "personalidades" e dos "triunfadores" do noso tempo, de renome internacional como Annie Leibowitz, calquera non ten renome con este nome, a non ser que sexa veciño e campesiño nunha aldea perdida de Polonia ou de Ucraina... En fin, que a foto en cuestión é tamén unha "obra de arte". Iso si, agora xa non se lles poderá responsabilizar en exclusiva aos medios de comunicación ou as grandes empresas multinacionais, porque os propios actores ou axentes históricos (das elites) están dispostos a seren trivializados. Xa o dixera, a comezos dos anos 90, un moi coñecido cantautor español, Joaquín Sabina, cando cantaba: "No habrá revolución, es el fin de la utopía, ayer Lenin y Zsa Zsa Gabor se casaban en New York...".

PD: Alguén se anima a fabricar conmigo chapas de Gorbachov como esas que hai do Che Guevara? O negocio ten futuro. Eu insistiría na mancha ou eczema da cabeza como concepto Kitsch a comercializar.

Senhoras e senhores, eis o peão mais peão do universo

A par dos peões virtuais, há um outro tipo de peões que se mexe incansavelmente por outros terrenos, estes bem materiais, calorentos e pulguentos!
Em seu tributo, elegemos como exemplo dessa determinação peonística o Julião, o peão mais peão do universo!
Pois é, o Julião movimenta-se a dobrar, não fora ele um quadrúpede, está sempre atento, pois o seu trabalho é o de guarda, brincalhão e lambusão, incomoda-se com as vespas como qualquer bom pachorrento dorminhoco.
E, sobretudo, é muito, muito farrusco.
Um abração, pois, ao superpeão Julião, que não esmoreça nas suas andanças campestres!
Ah, rafêro alantejano, tu queres é brincadêra.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

le plat pays qui est (aussi) le mien

Lá estarei dentro de umas horas.















Jacques Brel, LE PLAT PAYS, 1962
Avec la mer du Nord pour dernier terrain vague
Et des vagues de dunes pour arrêter les vagues
Et de vagues rochers que les marées dépassent
Et qui ont à jamais le coeur à marée basse
Avec infiniment de brumes à venir
Avec le vent de l'est écoutez-le tenir
Le plat pays qui est le mien
Avec des cathédrales pour uniques montagnes
Et de noirs clochers comme mâts de cocagne
Où des diables en pierre décrochent les nuages
Avec le fil des jours pour unique voyage
Et des chemins de pluies pour unique bonsoir
Avec le vent d'ouest écoutez-le vouloir
Le plat pays qui est le mien
Avec un ciel si bas qu'un canal s'est perdu
Avec un ciel si bas qu'il fait l'humilité
Avec un ciel si gris qu'un canal s'est pendu
Avec un ciel si gris qu'il faut lui pardonner
Avec le vent du nord qui vient s'écarteler
Avec le vent du nord écoutez-le craquer
Le plat pays qui est le mien
Avec de l'Italie qui descendrait l'Escaut
Avec Frida la blonde quand elle devient Margot
Quand les fils de novembre nous reviennent en mai
Quand la plaine est fumante et tremble sous juillet
Quand le vent est au rire quand le vent est au blé
Quand le vent est au sud écoutez-le chanter
Le plat pays qui est le mien.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

+ leitura no Verão

A ser verdade que o Verão é mesmo a altura para pôr a leitura em dia, em boa hora o júri do Booker Prize anunciou a longlist dos candidatos deste ano que aqui se transcreve:
Darkmans by Nicola Barker (Fourth Estate);
Self Help by Edward Docx (Picador);
The Gift of Rain by Tan Twan Eng (Myrmidon);
The Gathering by Anne Enright (Jonathan Cape);
The Reluctant Fundamentalist by Mohsin Hamid (Hamish Hamilton);
The Welsh Girl by Peter Ho Davies (Sceptre);
Mister Pip by Lloyd Jones (John Murray);
Gifted by Nikita Lalwani (Viking);
On Chesil Beach by Ian McEwan (Jonathan Cape);
What Was Lost by Catherine O'Flynn (Tindal Street);
Consolation by Michael Redhill (William Heinemann);
Animal's People by Indra Sinha (Simon & Schuster);
Winnie & Wolf by A N Wilson (Hutchinson).
Dos treze nomeados só sei a tradução do livro de Ian McEwan pela Gradiva, mas talvez haja de outros. Em todo o caso, entre pesquisas nas livrarias e encomendas na Amazon ainda se conseguem ler uns quantos até 16 de Outubro, dia da atribuição do prémio. Boas leituras.
Imagem: Eve Arnold - Marilyn Monroe Reading Ulysses, Long Island, New York, 1954.

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Nótula sobre o papel do indivíduo na história

Nascer é a principal decisão das nossas vidas. E não fomos nós que a tomámos.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Perfume exótico*

Uma ilha indolente e onde a natureza
Dá plantas singulares e frutos saborosos;
Rapazes cujo corpo é magro e vigoroso
[...]*


Para as, mas, sobretudo, para os «unhappy few» que estão em Lisboa, uma visão exótica, numa excelente e feliz combinação Baudelaire/Gaultier.


*Baudelaire - As flores do mal.






Paris em Agosto (ideologia de bac-à-sable)

Se o objectivo era pôr a miúda a falar francês, as primeiras incursões no maravilhoso mundo dos bac-à-sable parisenses (as caixas com areia dos parques infantis) foram um bocado falhadas. Primeiro, no jardim da Avenue Junot (Duc d'Abrantès, como se lê na placa da rua), demos com três mocinhas, qual delas a mais bonita, de Alfândega da Fé (Trás-os-Montes). Hoje, no parc de la Turlure, mais uma família veraneante portuguesa. Ontem, um Michelangelo bilingue franco-italiano com a camisola do Totti. Hoje, um Dario bilingue franco-inglês. Os parisienses franco-franceses foram-se todos embora de férias ou o multilinguismo invadiu de vez os castelos fortificados de areia deste país? Não dá para fazer uma sociologia do bac-à-sable.

Mas uma ideologia, sim. O bac-à-sable é o lugar onde se refugiou a ideia de fraternidade universal, a utopia de que todos seremos de novo felizes e perfectíveis juntos. Tudo é de novo possível no bac-à-sable, infância das relações entre as pessoas, mediada pelas crianças e estendendo-se aos pais sorridentes. O bac-à-sable é o contrário do metro em hora de ponta. A desconfiança e a inveja, o empurrão, o insulto, a ameaça de confronto físico, tudo são ali coisas de criança que se combatem com suaves sermões. Reina a tolerância, o sorriso amável, a pedagogia do bem comum em harmonia com a vontade individual. Não é um oásis, entenda-se, é um lugar primordial que existe e onde se está bem. Quem volta do bac-à-sable, volta um bocadinho Proudhon, volta um bocadinho Rousseau (embora eu duvide que o Rousseau fizesse castelos de areia tão bem como o Michelangelo).

domingo, 12 de agosto de 2007

Torga, neste Verão

Li Novos Contos da Montanha (1.ª ed., 1944) na adolescência; fazia parte do programa de Português. Retenho a repugnância que me provocou uma passagem de um dos contos em que um leproso se metia numa tina de azeite. [Não tenho o livro à mão, por isso não posso confirmar se era mesmo assim.] Além do conto «Leproso», não me lembro em particular de nenhum outro, mas recordo-me vagamente de um mundo rural agreste, rude e pobre, povoado de personagens singulares. Um mundo que estava muito distante da minha realidade suburbana da década de 1980.
Uns anos mais tarde, já no 12.º ano, li no manual de Filosofia um poema de Torga: "Não sou livre, que nem a própria vida mo consente / mas a minha aguerrida teimosia / é quebrar dia-a-dia / um grilhão da corrente". Decorei-o e acompanha-me desde então, porque continua a fazer sentido para mim.
Mais tarde, ofereceram-me um livro de poemas de Miguel Torga. Li-o, gostei muito, mas perdi-o (coisa rara).
Recentemente, tomei conhecimento da sua actividade política de oposicionista à ditadura. Torga foi perseguido pela PIDE ( a Torre do Tombo já disponibilizou o volumoso processo). Renato Nunes publicou no passado mês de Maio um livro sobre Miguel Torga e a repressão aos escritores durante o Estado Novo, de que Daniel Melo falou aqui e aqui (blogue do movimento cívico Não apaguem a Memória!).
Vou voltar aos contos de Torga, ainda neste Verão, e reencontrar a sua poesia.

O Verão e o Vinho

Não sabemos se por contingências da estação estival, se pela repulsa que os Peões têm às ortodoxias, se pela aversão às rotinas ou apenas se por razões que a razão desconhece, mas o post sobre vinhos que é regularmente postado aos domingos aqui no Peão esta semana foi postado quinta-feira no DJ Peão, pelo DJ Im-Becil.

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

A ASAE dá AZAR (perguntem ao Daniel)

Os pratos típicos portugueses entraram na clandestinidade, (já só nos restam os produtos Kosher do Corte Inglês). Neste Verão, os Peões, reunidos a Sul, estão a ser perseguidos pela ASAE e cada um revela as suas preocupações:
- Cláudia Castelo teme pelos caracóis;
- Sofia Rodrigues pelas farturas;
- Daniel Melo e Vallera pela aguardente de medronho.
Em contrapartida, a protopeão Iolanda Évora, na vanguarda da «cena clean», nada teme com o seu «kit» completo Bio.

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Leitura de Agosto...

... para não perder o gosto.


O monstro


Pois é, aproveitei as férias para pôr o cinema em dia. Depois do delicioso “À Prova de Morte” de Tarantino, tive a oportunidade de ver um filme muito interessante: “The Host” do realizador e argumentista sul coreano Bong Joon-ho's. Não se trata de mais um blockbuster para o Verão com sabor asiático a puxar para o filme de terror. É muito mais do que isso! Trata-se de uma verdadeira alegoria ao estado actual da sociedade da Coreia do Sul. Afinal, o monstro do filme não é mais do que o resultado aberrante do desenvolvimento alucinante ocorrido nestas últimas décadas. Mas ao contrário da alegoria de Platão, neste caso os iluminados são aqueles que estão no fundo da caverna. A não perder!

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Paris em Julho

Parece que vem aí o Verão..., mas por enquanto é só chuva. Ah, cá está o sol, é tão bom não foi? Chuva. Não, agora é que é, sol, calor. Nuvens, chuva. A culpa é do Sarkozy, afinal antes das eleições esteve muito bom tempo. Bom, finalmente começou o Verão. Mau, já acabou o Verão? Não, é este fim-de-semana que começa. Piquenique! Estamos já em Agosto. Acabou-se o fim-de-semana. Acabou-se o Verão. Talvez para a semana. Talvez para o ano.

domingo, 5 de agosto de 2007

Paris em Agosto

Vendam-me o Nuno Gomes e eu vendo o que resta da minha alma benfiquista.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

When the shit hits the fan

Não supreende ninguém que em política internacional os estados façam acordos envolvendo contrapartidas que envergonhariam qualquer cidadão. Quando assim é esconde-se a diplomacia no secretismo bem coberta pela chancela do interesse nacional. A aceitação geral que a política internacional não obedece ao (suposto) dever de transparência que obedecem as outras áreas da política parece-me em si bastante preocupante em regimes democráticos. Felizmente que de vez em quando há quem decida, talvez por inadvertência, desvendar de que são feitas essas trocas entre estados. Foi o caso esta semana de Saïf Al-Islam Kadhafi, filho e possível sucessor do Coronel Mouammar Kadhafi líder da Líbia, que revelou numa entrevista ao Le Monde os contornos das trocas que levaram à libertação das enfermeiras e médico búlgaros condenados à morte na Líbia, supostamente por terem infectado propositadamente crianças com o vírus da SIDA.

Convém referir que a acusção contra as enfermeiras e médico búlgaros é completamente descabida. Um relatório encomendado pelo próprio tribunal líbio que julgava o caso a Luc Montagnier e Vittorio Colizzi (que são "só" respectivamente o responsável pela descoberta do HIV e o presidente da Fundação Mundial para a investigação e prevenção da SIDA) conclui que as infecções das crianças com HIV não pode ser sido causada pelo pessoal médico búlgaro mas pela falta de condições de higiene no hospital em que ocorream. O tribunal recusou depois o relatório que havia encomendado a Montagnier e Colizzi, e elaborou o seu próprio parecer. A revista Nature solicitou a vários especialistas a opinião sobre ambos os relatórios, e o apoio a Montagnier e Colizzi é claro e unânime. A acusação levada a tribunal baseou-se apenas em confissões obtidas sob tortura.

As enfermeiras e o médico búlgaros foram libertados esta semana, poucos dias depois do presidente francês Nicolas Sarkozy ter visitado a Líbia. A União Europeia já tinha dado à Líbia ajuda financeira às famílias das vítimas. Mas na tal entrevista Saïf Kadhafi reconhece que a Líbia obteve como contrapartida para a libertação dos prisioneiros búlgaros por parte da França, e com intervenção directa de Nicolas Sarkozy, a negociação de dois contratos de fornecimento de armamento (de 168 e 128 milhões de euros). O negócio foi confirmado por líbios e franceses. Claro que estas declarações provocam o embraço do governo francês, mas não é só a França que tem razões para se preocupar. Saïf Kadhafi deixa também entender que o Reino Unido deu contrapartidas que envolvem Abdel Basset Ali Al-Megrahi, condenao a prisão perpétua na Escócia pelo atentado de Lockerbie. Foi precisamente por a Líbia ter aceite a extradição de Al-Megrahi que lhe foi levantado o embargo internacional em 2004. Parece agora que o direito de apelo que foi concedido pela segunda vez recentemente a Al-Megrahi é uma contrapartida para a libertação das enfermeiras e médico búlgaros. Saïf Kadhafi vai mais longe e afirma-se esperançado na extradição de Al-Megrahi para a Líbia em breve (o que foi desmentido por Londres).

Assim se faz portanto a diplomacia. Pessoal médico em missão humanitária vê-se acusado de crimes absurdos, torturados e condenados à morte. Mas não há problema, transformam-se os condenados em moeda de troca para venda de armamento. No pacote talvez se inclua ainda a troca daquele que há poucos anos era a condição absolutamente essencial para que a Líbia fosse aceite na comunidade internacional. Nisto algumas coincidências de datas parece-me estranhas; Quando a Líbia extraditou Al-Megrahi em 2003, já as enfermeiras búlgaras estavam presas, desde 1999, no entanto só foram condenadas pela primeira vez em 2004, quando a Bulgária fazia já parte da União Europeia.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Em slowmotion, ou o ideal koala...

Pois é, meus caros,
a pedido de várias famílias, neste caso, famílias de bloggers, aqui estou eu para vos dizer que é bem provável que neste mês que ora irrompe se esmoreça ligeiramente o estonteante ritmo de produção e a febril criatividade a que nos habituou este vosso blogue.
E digo ligeiramente, suavemente, calmamente, tal como o tempo que faz. Suave, ligeiro, calmo...
Há uns anos atrás vi um daqueles documentários da moda sobre o designado «reino animal». Era dedicado ao koala. Sucede que este ternurento bichinho tem uma particularidade curiosa: demora séculos a descer duma simples árvore. Quando digo uma eternidade é mesmo a sério: levava horas a desprender-se dos galhos.
Pois este blogue é capaz de ficar koalazado durante uns tempos.
Nada como ir espreitando, nunca se sabe. Pode ser que, entretanto, algum dos koalas tenha conseguido chegar ao solo e tenha vislumbrado um amigável teclado...
Boas férias!!!