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sábado, 19 de fevereiro de 2011

Aprender a rezar na Era da Técnica

Aprender a rezar na Era da Técnica. Posição no mundo de Lenz Buchmann é um romance de aprendizagem na era do metro e da internet. Um romance de Gonçalo M. Tavares que é uma teia de micro-ficções, com capítulos que se podem ler entre duas paragens de metro. Dividido em três partes, a primeira, «Força», é dedicada à afirmação no mundo de Lenz Buchmann e do que ele tem de aprender para obter uma posição forte: aprender a fazer sexo, aprender a dominar a técnica que lhe permite ser um grande médico, aprender a dominar os homens na política. A excitação sexual perturba esta aprendizagem. A atitude perante a religião é orientada pelo aforismo: Nos pântanos os motores não funcionam. Para conquistar a sua posição no mundo, não basta a Lenz Buchmann deixar de pôr os pés na Igreja, é necessário expulsar o Espírito Santo do seu corpo.

Na segunda e terceira partes – respectivamente «Doença» e «Morte» - Lenz Buchmann é destruído pela doença. Quando está a morrer, a Igreja, a pedido de uma secretária, põe os pés de um padre no quarto do moribundo. Sem consequências, além de uma mancha de saliva na boca de Lenz. Prestes a dar o último suspiro, uma luz, vinda de um televisor, chama Lenz pelo nome e ele deixa-se ir desta vida. A posição no mundo de Lenz afirma-se sobre o fazer; as portas da morte são franqueadas por um «deixou-se ir».

Perante este enredo, o leitor pergunta-se qual o sentido do título. A resposta provisória que me ocorre é a seguinte: o título não indica o trajecto da personagem principal, mas a possibilidade que ele rejeita. Como se, numa encruzilhada, uma placa indicasse o caminho para Aprender a rezar na Era da Técnica e Lenz decidisse «não ir por aí». É a interpretação que me parece mais coerente com declarações do próprio autor. Numa entrevista ao Expresso a 6/11/2010 Gonçalo M. Tavares afirma «A crença é significativa no meu percurso» e logo observa: «Há uma personagem de Hans Christian Anderson a quem pedem para rezar, e ela só se lembra da tabuada. Depois pedem-lhe a tabuada, e só de lembra da oração. Continua a haver um conflito entre quem acredita que se vai salvar pela oração e quem pensa que vai ser a tabuada, a racionalidade, a tecnologia».

Romance indubitavelmente iconoclasta, Aprender a rezar na Era da Técnica atinge com tanta força a imagem do mundo de uma religião convencional como um mundo feito à imagem do otimismo e do fetichismo tecnológico. Devolvendo a cada leitor, com uma intensidade acrescida, as suas dúvidas.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Senhores projectos



Uma casa de papel para um ser de palavras, um projecto de arquitectura para uma, ou várias, personagens dos livrinhos de «O Bairro» de Gonçalo M. Tavares. Foi este o desafio colocado a um grupo de alunos universitários de arquitectura. O resultado está patente ao público no Lx Factory, em Alcântara.
Gonçalo M. Tavares na «poética» que tem desenvolvido sobre «Bloom Books», declara, aqui, que na ficção não faz sentido a perguntar: onde? Ou, se o fizermos, não devemos levantar os olhos do texto. A história que estamos a ler acontece mesmo na página escrita. Mas como também escreve noutro lugar qualquer da sua «poética» que o texto não deve imitar a fotografia, temos a liberdade de construir as nossas imagens das histórias e de compará-las com as imagens que outros criaram. O senhor Valery, o senhor Kraus, o senhor Brecht podiam mesmo habitar as maquetes em exposição no Lx Factory? Para responder a esta pergunta é mesmo preciso levantar os olhos do texto, sair de casa e ir lá ver. Aqueles projectos de habitação podiam tornar-se reais e povoar Alfama, o Bairro Alto, etc? Na minha opinião de leigo alguns tinham pernas para ficar de pé frente ao rio.
Quanto à «poética» de Gonçalo M. Tavares, Borges escreveu que o valor de qualquer «poética» reside não em ser mais verdadeira do que outra, mas em ser mais estimulante para o escritor que a inventou ou adoptou. Que lhe faça, pois, bom proveito.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Artistas globetrotters

Contou Gonçalo M. Tavares um engenhoso plano turístico imaginado por Philip Roth no livro Portnoy's Complaint (1969), editado em português pela Bertrand, mas actualmente indisponível no mercado.
Um dos personagens tem como grande sonho conhecer os Estados Unidos, e, para concretizar essa ambição decide dormir com uma mulher de cada Estado. Para ele, só depois de se ter deitado com o número de mulheres correspondente ao número dos Estados é que poderia afirmar conhecer o país.
O mesmo «desejo excursionista», surge nas artes plásticas com Tracey Emin que na instalação My Bed, concorrente ao Turner Prize em 1999, interrogava-se se para conhecer o mundo bastaria ter relações sexuais com uma pessoa de cada país, ou se seria mesmo necessário visitar o sítio.
A mim, esse «turismo» sempre me pareceu de uma originalidade promissora...
Imagem: Tracey Emin - Everyone I Have Ever Slept With, 1963-1995