Ao contrário do que muita gente imagina, a vitória do “não” na Venezuela tem mais consequências no campo externo do que interno. Internamente, Hugo Chaves continuará com os seus superpoderes, pois as mudanças pretendidas no referendo, que afetariam apenas 69 dos 350 artigos da Constituição, já foram aprovadas pela Assembléia Nacional venezuelana (controlada há muito tempo por partidários chavistas), que deu a ele, em janeiro último, poderes amplos para governar por meio de decretos. Essa lei o autoriza a ditar decretos com força de lei em 11 áreas durante um período de 18 meses, mas poderá facilmente ser renovada pelo Legislativo em qualquer momento.
Com relação aos Estados Unidos, nada muda agora. Os dois países continuarão mantendo as suas relações de interdependência. Ou seja, Hugo Chaves precisa vender aproximadamente 50% de seu petróleo (número que já chegou bater a casa dos 80%) para os ianques e os ianques não podem prescindir desse petróleo para tocar os seus carrões beberrões. O que mudará talvez será apenas o comportamento pessoal do “el diablo” Bush, que nesta altura deverá estar saltitando feito um anuro entorpecido pelos labirintos da satânica White House.
Já no contexto latino-americano, onde Cháves tenta exportar o seu modelo político, a derrota do “sim” representa um balde de água fria em muitas cabeças afoitas. São os casos específicos do Equador e da Bolívia, que deverão interpretar a derrota chavista como um sinal de alerta. Mesmo porque Rafael Correa (Equador) governa com minoria parlamentar, cuja maior diversão é destituir presidentes eleitos, e Evo Morales (Bolívia) tem apenas 1/3 do país sob o seu controle.
No Brasil, a derrota de Hugo Chávez foi um recado direto ao PT que defende mudanças na Constituição para viabilizar um terceiro mandato de Lula. Apesar de o presidente brasileiro se colocar publicamente contrário a esta alternativa, tem se empenhado muito pouco ou quase nada em conter os ânimos de seus correligionários petistas alardeadores da "re-releição". Ao contrário: faz vistas grossas e deixa rolar por toda Terra Brasilis esse imenso balão-de-ensaio. Se ele tinha alguma dúvida, acho que o eleitor venezuelano já o esclareceu.
2 comments:
Caro Manolo,
Mudar a constituição não é novidade na América Latina. No Brasil, por exemplo, Não foram só governos autoritários como os dos generais que rasgaram a constituição de 1946 e outorgaram uma autoritária. Para não falar de Vargas. Governos democráticos (ou democraticamente eleitos) também o fizeram. O último deles foi o de FERNANDO HENRIQUE CARDOSO. A constitiuição de 1988 não permitia a reeleição para cargos executivos, e o PSDB/PFL mudaram a constituuição com o apoio do social-democrata FHC e comprando os votos dos senadores e deputados com dinheiro público. Eu como brasileiro, gostava muito que na altura, tivéssemos um ministério público e uma imprensa tão vigilantes com a democracia e com o erário público como agora parce que temos. VEJA bem!
Olá, João.
Sim. Como também as sucessivas tentativas de golpes na América Latina não é novidade alguma pra ninguém. Também limitar o debate ao argumento de que porque um fez o outro pode fazer, além de minimalista, é uma tentativa de conturbar qualquer discussão mais abrangente sobre qualquer tema. Creio que o debate institucional tem de ser o mais amplo possível, independente de quem esteja no poder ou na oposição.
Na verdade, as discussões acerca das regras eleitorais no Brasil são sempre conduzidas por interesses imediatos. Basta não ter um sucessor que o presidente da república pensa logo em prolongar o seu mandato. Foi assim com o filhote da ditadura Sarney (que mudou a constituição para ganhar mais um ano no governo) , foi assim com o tucano FHC e é esse o caminho que uma ala expressiva do PT quer para Lula. O que há de comum aqui? O personalismo político. O mesmo personalismo que os impede de fazer um sucessor para dar sequência ao ideário partidário. Parece-me que por estas bandas é mais fácil mudar a constituição do que mudar a mentalidade dos políticos.
Esclareço-te também que quando veio à tona os boatos (logo depois que Lula foi reeleito) sobre o terceiro mandato, o PT rechaçou a idéia imediatamente, atribuindo-lhe caráter de uma tentativa de golpe-branco do tucanato com o objetivo de desestabilizar o governo. Na verdade, ele foi lançada pelo MR8 (movimento que coabita o PMDB quercista), com objetivos nada claros.
Agora, sobe o seu irônico "VEJA bem!" digo-lhe que ele é totalmente descabido e inoportuno, além de inócuo pra quem deseja manter um diálogo franco e honesto. Mesmo porque as pessoas que estão à esquerda do PT têm se manifestado contra muitas posições do governo e suas alianças. O PT não é o único representante da esquerda brasileira. A própria história do partido confirma isto.
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