Acabou de ser transmitido no programa «Cosmorama», da RDP2, uma recriação dum antigo programa radiofónico da autoria do compositor e musicólogo Fernando Lopes-Graça, dedicado à música popular tradicional. Segundo os realizadores de Cosmorama, esse antigo programa terá sido transmitido pela defunta Emissora Nacional de Radiodifusão, nos anos 60. Como não deverá haver registo dele, Alexandre Branco e Ana Telles recorreram à leitura do texto do guião do programa, escrito por Lopes-Graça, acompanhada da divulgação das canções que o mesmo guião referia, recorrendo à obra «Antologia da música regional portuguesa» (1964-71), publicada por Lopes-Graça e Michel Giacometti, reeditada em 1978 e transposta para cd em 1999. Este projecto, que o etnomusicólogo corso intitularia de Arquivos Sonoros Portugueses (ap. Sérgio Fonseca), foi idealizado após o primeiro encontro entre Lopes-Graça e Giacometti, em 1959 (vd. aqui).
Tendo analisado a temática da preservação e divulgação etnográficas sob o salazarismo*, no qual abordei aquele projecto, nada encontrei então sobre tal programa de Lopes-Graça na rádio oficial. Pelo contrário, fiquei até algo surpreendido, uma vez que este criador e intelectual antifascista era persona non grata do regime ditatorial, tendo tido muitas dificuldades para financiar aquele modelar projecto etnomusicológico (os parcos apoios oficiais vieram apenas de 2-3 juntas distritais, o resto foi financiamento particular, incluindo do Jornal do Fundão).
Seja como for, o programa foi muito interessante de seguir e poderá ser escutado brevemente aqui por quem esteja interessado. Predominaram as canções da Beira-Baixa (tanto de trabalho como de romarias), embora também tenham sido abrangidos os cancioneiros do Algarve, Alentejo, Trás-os-Montes, Douro e Minho. Esta saliência pode estar relacionada com o próprio percurso de Lopes-Graça, uma vez que o seu primeiro contacto com recolhas da tradição músical portuguesa se deu precisamente na Beira-Baixa, em 1946 (cf. aqui).
Em 2003, o Museu Nacional de Etnologia, em Lisboa, passou a disponibilizar o acesso digital presencial às recolhas de Giacometti (seria bom garantir também a sua acessibilidade na Internet, pelo menos de parte do acervo).
Da aldeia alentejana de Peroguarda, onde Giacometti viveu, deixo-vos «Entrai pastores» (cante tradicional por si recolhido). Quem quiser saber mais sobre o projecto deste duo pode ler esta entrevista com Giacometti: «As canções tradicionais sobrevivem na memória colectiva do povo» (de 1971).
*Vd. Salazarismo e cultura popular (1933-1958), Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais, 2001 (v.o. de 1997), p. 264-75.
Seja como for, o programa foi muito interessante de seguir e poderá ser escutado brevemente aqui por quem esteja interessado. Predominaram as canções da Beira-Baixa (tanto de trabalho como de romarias), embora também tenham sido abrangidos os cancioneiros do Algarve, Alentejo, Trás-os-Montes, Douro e Minho. Esta saliência pode estar relacionada com o próprio percurso de Lopes-Graça, uma vez que o seu primeiro contacto com recolhas da tradição músical portuguesa se deu precisamente na Beira-Baixa, em 1946 (cf. aqui).
Em 2003, o Museu Nacional de Etnologia, em Lisboa, passou a disponibilizar o acesso digital presencial às recolhas de Giacometti (seria bom garantir também a sua acessibilidade na Internet, pelo menos de parte do acervo).
Da aldeia alentejana de Peroguarda, onde Giacometti viveu, deixo-vos «Entrai pastores» (cante tradicional por si recolhido). Quem quiser saber mais sobre o projecto deste duo pode ler esta entrevista com Giacometti: «As canções tradicionais sobrevivem na memória colectiva do povo» (de 1971).
*Vd. Salazarismo e cultura popular (1933-1958), Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais, 2001 (v.o. de 1997), p. 264-75.
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