terça-feira, 24 de abril de 2007

E se ganhar Sarkozy?...

Começaram os gestos de cortesia de Sarkozy e Ségolène para com Bayrou, que pensa já nos trunfos que pode garantir nas eleições legislativas. Se contar o passado histórico das formações políticas e o seu "interesse partidário", é provável que Bayrou apoie Sarkozy; se contar o seu sentido de dedicação à causa pública, Bayrou devia apoiar Ségolène. Tudo porque é altamente duvidoso que Sarkozy consiga fazer alguma mudança de fundo num país como a França. Não é a questão da "liberalização" que ele promete ou deseja - mais ou menos explicitamente - ser "boa" ou "má". Nesta altura do campeonato, com a "balkanização" dos estatutos profissionais, dos contratos laborais, das regulações dos diversos mercados, uma liberalização bem feita, de acordo com critérios transparentes, não traria grandes males. A questão não é tanto essa. O problema é que reformar um país como a França não é como reformar, por exemplo, o Reino Unido, como fez Thatcher há quase 30 anos. O nível de potencial conflitualidade social, o poder de veto de diferentes parceiros sociais e o grau de stickiness das instituições é tal que só uma abordagem negociada é que permitiria fazer reformas bem feitas. É improvável que Sarkozy consiga ter capacidade negocial para enfrentar as resistências previstas, e é improvável que os "resistentes" queiram negociar com Sarkozy. Prepara-se para ficar tudo na mais ou menos na mesma, sujeito à lógica do sinuoso muddling through, não apenas por mais 5, mas eventualmente por mais 10 anos, dado que, tradicionalmente, quem cumpre o primeiro mandato, acaba por estar em vantagem para ser reeleito (vide Mitterrand e Chirac).
A única coisa positiva seria talvez o impacto no PSF de mais uma travessia do deserto; talvez o partido fosse capaz de se refundar, iniciar um debate político com os seus congéneres europeus, pensar do início alguns princípios - como levar a sério o princípio da redistribuição e da defesa dos mais fracos e preocupar-se menos com a classe média-alta, esse tal grupo de "explorados" que está entre os 25% mais ricos e que vê qualquer medida que mexa nos seus bolsos como um ataque "neoliberal". O PSF gosta de se ver na vanguarda, mas na verdade muitos dos princípios que defende, mais ou menos implicitamente estatistas, já deviam ter dado lugar a uma estratégia social-democrata - nos países nórdicos que os socialistas franceses gostam de elogiar (mas sem grande convicção: é sempre numa lógica de dizer que o modelo americano não é "único") isso já aconteceu há mais de meio século. A lógica não devia ser "resistir" ao capitalismo (através do Estado: o que leva a proteger uns e deixar os outros de fora, precisamente os mesmos que pagam a protecção dos primeiros...), mas melhor compreendê-lo para o melhor "instrumentalizar", com o objectivo de cumprir os objectivos de crescer economicamente e reduzir as desigualdades. É que, hoje, a França não está a fazer nem uma coisa nem outra.

2 comments:

Luís Marvão disse...

Penso que isso não será problema para o Hugo...
Problema seria a vitória da "esquerdista" Ségolène....
Porque entre Sarko e Sócrates, que presumo seja seu mestre e senhor, as diferenças não são de monta.
Já reparou no que Sarkozy disse sobre o nosso Sócrates:
«Felizmente os socialistas franceses não são como ele, caso contrário teria dificuldade em posicionar-me» In PÚBLICO

Hugo Mendes disse...

Não me diga que nova estratégia é equiparar Sócrates a Sarkozy...Ai esta imaginação.