sexta-feira, 6 de abril de 2007

A caverna platónica e a suplantação da dupla cegueira: Cartas de Iwo Jima


O Barão Nishi e o general Kuribayashie são personagens que não querem ser heróis e que lutam por uma causa perdida. Há sempre qualquer coisa de fascinante nas causas perdidas, fascínio esse, que se estende a estas duas personagens, e ao realizador, Clint Eastwood.
Mais que o general Kuribayashi, o Barão Nishi funciona como um alter-ego de Eastwood neste filme.
O Barão fica cego na caverna platónica, uma arquitectura táctica militar e defensiva posta em práctica pelo general.
A cegueira é aqui usada alegoricamente para demonstrar o conhecimento. O Barão, outrora um campeão olímpico, é agora vítima da guerra e dos seus martírios. A cegueira leva-o a um conhecimento que suplanta a dupla cegueira dos que estão na caverna, ou seja, daqueles que perplexos ou indiferentes, não vêem nem querem ver.
Eastwood, com este seu projecto de guerra cinematográfica (Flags of our fathers e Letters from Iwo Jima) vem igualmente demonstrar um outro tipo de conhecimento, perante a cegueira, até agora mais ou menos vigente no cinema americano sobre a II Guerra Mundial. Neste projecto, o campo e o contra-campo de uma batalha: Iwo Jima. Um ponto de vista americano (Flags of our fathers) com um excurso sobre a guerra do pacífico como a guerra para além da libertação da Europa, e outro japonês (Letters from Iwo Jima), o da impossibilidade de um projecto de guerra contra uma potência como os Estados Unidos.
A lucidez de Clint Eastwood, propaga-se até à última imagem: um plano a partir do monte Suribachi sobre a praia e o horizonte, onde já se intui a bomba atómica. Tal, como o Barão, o realizador projecta a sua visão para além da dupla cegueira.

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