
Conseguimos, até, visualizar todo o ambiente: uma aldeia pobre, sem empregos - as chaminés industriais da Covilhã já há muito se apagaram, onde a terra entrou num pousio mais ou menos permanente, sem escola, onde não há nada, a não ser um café, onde todos bebem e bebem muito.
A partir daqui, imaginamos a violência surda com que se perseguem, que exercem uns sobre os outros, maridos bêbedos sobre mulheres embrutecidas; rapazes bêbedos e analfabetos sobre raparigas «shakirizadas» e analfabetas; famílias sobre famílias por questões passadas, presentes e futuras; patrões senhoriais sobre empregados desprotegidos; velhos bêbedos e rancorosos sobre outros velhos bêbedos e rancorosos, tudo mediado pelas únicas autoridades que conhecem, para os homens o dono do café, para as mulheres a recepcionista do centro de saúde e para todos a televisão. É natural que, de vez em quando, alguma coisa «corra mal» e acabe nas páginas dos jornais.
E por muito que tenhamos um sorriso escarninho direccionado aos pavilhões polidesportivos, aos ranchos folclóricos, ao canto coral, às bandas do coreto, às senhoras dos arraiolos e aos homens do chinquilho, já tudo parece preferível a este «pântano» alcoolizado, de onde as aldeias não conseguem emergir.
Imagem: Grant Wood - Gótico Americano, 1930.
1 comments:
Se eu resolvesse fazer um livro sobre: "Fernando Vale na obra de Miguel Torga"
Quem era o autor do livro? Era Miguel Torga?
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