sábado, 8 de setembro de 2007

OUVIDOS UNI-VOS







Recebo o CD "Ouvidos Uni-vos" o mais recente trabalho de Luiz Tatit.
Este músico paulista mora ali pelos lados da Vila Ida, muito perto da Vila Madalena, a “Vila Madá”, bairro boémio da cidade muito frequentado pelos universitários.

Nada mais paulista do que a capa do CD, uma colagem de vários rostos anónimos. Ou o refrão de uma das músicas que nos lembra a Marginal do Tietê e a poluição, a grande marca da paisagem urbana e da vida dos paulistas:
(…)
Vi nas asinhas
De um pernilongo
Lama do rio
Rio do mal
Nem bem entrou na cidade
Virou marginal
(…)
Rio Tietê,
Nosso E.T.
Cadê?
Melhor esconder
(…)
[1]

O músico continua a brindar-nos com o seu gostinho especial em juntar o tom do universo infantil às coisas que também tocam os adultos:
Eu ando tão dodói
Mas tão dodói
Que quando ando dói
Quando não ando dói
Meu corpo todo dói
Tendão dói
Dedão dói
Pomo-de-adão dói
Ouvido dói
Libido dói
Fígado dói
Até meu dom dói
Pois quando canto
Não importa o tom dói
[2]

Além da parceria, Luiz Tatit também presta homenagem a Itamar Assumpção (1949-2003), o músico da poesia urbana de São Paulo que trouxe o “som do porão da cidade”:
Bem mais que um tipo de rock
pura assunção de Sampop
(…)
Rock de breque, rock de breque
Toque de mestre Assumpção
Tente entender numa boa
Sol de São Paulo é garoa
Cara em São Paulo é coroa
Praia é balcão
(…)
Nobre missão de Sampop
Entra em acção desentope
Ouvidos uni-vos
Num grande orelhão
[3]
Escutem a senha
Que vem lá da Penha
Com breque de pé e de mão
[4].

O ritmo nordestino da maior cidade brasileira está presente n´ “O Baião do Tomás”[5] e o “Baião de Quatro Toques”[6].
Também oiço a voz límpida, de passarinho, da Ná Ozetti em “Minta”[7]. Diz o próprio Tatit que ela é a “voz que não pode faltar”.

Ouvidos oiçai.

[1] "Tietê", de Luiz Tatit.
[2] “Dodói”, de Luiz Tatit e Itamar Assumpção
[3] No Brasil, em geral, as cabines telefónicas têm o engraçado formato de uma orelha humana.
[4] "Rock de Breque", de Luiz Tatit
[5] "Baião do Tomás", de Chico Saraiva e Luiz Tatit
[6] "Baião de Quatro Toques", de Zé Miguel Wisnik e Luiz Tatit
[7] "Minta", de Ricardo Breim/Luiz Tatit

4 comments:

Daniel Melo disse...

Gostei :)
E não há por aí um cheirinho destas músicas que nos possas dar em 1.ª mão? Um link qualquer?
Se for do mesmo nível do «Benguelê» do João Bosco, vai ser bom ouvir.
De facto, a música brasileira é um mundo fantástico.
Sortuda!

Iolanda Évora disse...

Daniel: A quem pedes dicas para encontrar algo pelos tortuosos caminhos da internet! Quer dizer que vou providenciar, mas nao de imediato.
Mas vêm aí outros cd´s directamente de Sampa. Bons pretextos para escutas partilhadas entre peões: Ná Ozetti (como pude deixar de ouvi-la por tanto tempo?), Monica Salmaso (estava esgotado na Fnac. Bom sinal?), o melhor Tatit em "Felicidade", novas cantoras paulistas (como a Ceumar), e é claro Itamar Assumpção e Luis Melodia. Juntamos o Tatit que deu origem a este post, o "Benguelê" do João Bosco(de novo, porque não?), o Zé Miguel Wisnik (no excelente CD que fez para o espetáculo Nazareth da companhia de dança "Grupo Corpo" de Belo Horizonte), o "Atenciosamente" do DUOFEL, e para arrematar, porque não o "Bebadachama" do Paulinho da Viola? Eclético e democrático.
Sortudos.

Anónimo disse...

Olha, Iô, o Tatit é muito bom, mas eu gostava muito mais dele quando fazia parte do Rumo. Acho que como solo ele tem se perdido um pouco. Mas, enfim, ele merece todo o nosso respeito.

Iolanda Évora disse...

Boa lembrança! O grupo Rumo orientou muita gente lá pelas bandas... Anos 80. Depois do Rumo é provável que a bússola fique um pouco frenética, não acha?