Para o desenlace ajudaram, em parte, as próprias limitações e contradições dessa mesma política social. Dou como exemplo, para mim paradigmático, a política relativa à paternidade (com ligação à da natalidade). O actual governo teve aqui um mau desempenho. Vejamos porquê.
É verdade que estendeu a licença parental com 83% do salário de 5 para 6 meses (desde que o pai goze também 30 dias ou 2 períodos quinzenais) e criou novos apoios (vd. Dinheiro & direitos, n.º 95, p. 28/9). É pouco ainda: noutros países europeus supera os 12 meses, para ambos os pais. Depois, lançou nesta campanha a promessa dum patético plano poupança sub-18, que aqui já critiquei, deixando de lado o essencial: dar mais tempo aos pais para estarem com os filhos (no 1.º ano de vida, pelo menos) e apostar seriamente na cobertura pública de infantários e creches, ainda em número muito insuficiente e alguns com falta de espaço, funcionários e condições. Esta era uma aposta já avançada no 2.º governo de Guterres, relembre-se. E, até agora, foi sempre deixada para trás.
Por fim, acabou com a jornada contínua na administração pública, a que podiam recorrer os pais com crianças até aos 12 anos à sua guarda. O contra-argumento de que, uma vez que as escolas agora têm todas horário alargado até às 17h30 (salvo erro) tal prerrogativa deixava de ter sentido, não colhe totalmente. Em primeiro, porque as creches podem não ter esse horário, e até ao ensino básico pode haver pais que deixem as crianças com outros familiares enquanto trabalham. Depois, para pais com várias crianças para educar, a situação piorou, pois têm menos tempo para estar com elas e acompanhá-las. Por fim, há muita gente que ganha mal na administração pública e recorre a outros trabalhos.
Por aqui já se começa a perceber melhor porque é que Portas pôde sair por cima. É que, nos últimos 14 anos, só 3 foram de sua co-responsabilidade em matéria de governação. Os restantes foram do PS de... Sócrates.
Nb: na imagem, menina nazarena segurando um coelho («La petite fille au lapin», foto de Jean Dieuzaide, Nazaré, Portugal, 1954).
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