quarta-feira, 18 de abril de 2007

Persistências

De muito longe (e sem toda a informação indispensável) esse debate sobre as “novas oportunidades” parece-me também surreal mas, infelizmente, representativo dos arcaísmos persistentes da sociedade portuguesa. Parece que sobre o que toca à formação escolar das classes populares, qualquer que seja o regime, a história repete-se. A honra dos sem-estudos que agora alguns defendem assemelha-se aos discursos sobre os analfabetos do tempo do Estado Novo (os pobres honrados na boca dos salazaristas). Na altura, alguns proclamavam que não se devia obrigar os analfabetos a ler e a escrever porque eles, lá no fundo, tinham uma certa inteligência e as campanhas de alfabetização eram “classistas” e hostilizavam os pobres.
A inutilidade da formação profissional dos trabalhadores também assemelha-se à reacção de certos fragmentos da elite quando se iniciou o Instituto de Formação profissional nos anos 60. Mais uma vez dizia-se que essa política não era necessária.
Mas o que sempre houve atrás desses discursos foi uma vontade de fechamento social das elites (que de forma estranha não desdenham mandar os filhos deles à escola e à universidade : porque será?) e uma vontade de manter os salários baixos. Porque essas coisas da formação profissional podem sempre implicar aumentos de salários! E esses trabalhos que todos dizem dever ser respeitados não dão, na maioria das vezes, direito à ordenados “respeitáveis”. Por isso, tal como o Zed, não compreendo que pessoas que vêem da esquerda comungam com ideias reaccionárias defendendo uma hierarquia natural e imutável da sociedade.

5 comments:

CLeone disse...

Se quer compreender, tem de deixar de identificar esquerda e progressismo, começando por distinguir entre esquerdas e entre o progressismo e aquilo em que ele recusa tornar-se. E ver que outros traços, além de «esquerda», apresentam essas elites, consideradas historicamente pelo menos desde meados do século XVIII

Hugo Mendes disse...

Obrigado, Victor: como outros peões gostam (e bem) de dizer, é bom que não nos apaguem (ess)a memória - que aqui pode ser bem amarga, tendo em conta as posições que alguma esquerda tem tomado recentemente nesta questão.

Samir Machel disse...

Obviamente que mais aprendizagem é positivo.

O problema é se nao estaremos simplesmente a trabalhar para as estatísticas...

Hugo Mendes disse...

Por trás das estatísticas estão pessoas, ou não?

CLeone disse...

Não pá, por trás está o sistema opressor das minorias, das mulheres e dos pobres obrigados a permanecer pobres. Francamente...