segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

Presidenciais francesas: Queres ser meu padrinho? (II)

Vou desenterrar aqui uma polémica (que não chegou a sê-lo) com um outro peão, o André Belo. Foi a propósito de Le Pen poder não se candidatar às presidenciais por não conseguir reunir padrinhos suficientes (conforme o post ali mais abaixo). Escrevi há tempos um post numa altura em que o Le Pen andava a estrebuchar um bocado sobre essa história dos apadrinhamentos, e fazendo-se de vítima, colocava o ónus sobre o sistema eleitoral dizendo que não era normal que um candidato que em 2002 foi à segunda volta não pudesse apresentar-se este ano por causa de uma questão processual. Na minha opinião, o que não é normal é que Le Pen não consiga arranjar os 500 apadrinhamentos necessários. Sem estar a defender este sistema eleitoral, se Le Pen não o conseguir é antes demais uma enorme derrota política para si próprio e para a Frente Nacional, e diz bem do que são um e outro, recolhem muitos votos de protesto mas ninguém os leva a sério. O André respondeu (em francês) que essa seria receita para o desastre. E porque razão a polémica não chegou a sê-lo? Porque eu estou de acordo com o André, não obstante o que já escrevi, o que eu gostaria mesmo era de ver Le Pen derrotado nas urnas, e não na secretaria. Diga-se ainda que mais recentemente Le Pen não só não se tem queixado do sistema eleitoral como faz sigilo absoluto sobre a recolha de padrinhos, e é claro que tentar interpretar esta alteração de estratégia é especulativo mas quer-me parecer que vai conseguir apresentar-se mais uma vez às eleições.

Se Le Pen tem dificuldades em reunir apadrinhamentos, outros naturalmente têm ainda mais. A tal profusão de esquerdistas, de Arlette Larguiller (essa que corre para a sua sexta candidatura) a José Bové vão ter problemas para conseguir formalizar as suas candidaturas. Isto para já cria logo um problema: que leitura fazer das sondagens? (a propósito, quem quiser informações detalhadas sobre sondagens, o Le Monde tem um excelente site com resultados de vários institutos, dos últimos 4 ou 5 meses) Apesar de tudo os "pequenos candidatos" somam no seu conjunto qualquer coisa como 15% das intenções de voto, e Le Pen outros tantos. Se estes candidatos não estiverem no boletim de voto, quem vai beneficiar com isso? É uma quantidade apreciável de eleitores e pode alterar bastante o equilíbrio de forças entre os candidatos dos grandes partidos. Eu vejo duas possibilidades diametralmente opostas. No quadro mais simples beneficia o candidato do grande partido da mesma área política, Sarkozy à direita e Ségolène à esquerda. Provavelmente o PSF e a UMP estão a contar com este cenário, mas parece-me demasiado fácil, se os votos nos "pequenos" candidatos são votos de protesto dificilmente podem beneficiar os grandes partidos, em particular numa primeira volta. Se estes votos são genuinamente votos de protesto, então é possível que se transformem em abstenção, o que objectivamente beneficia o campo político contrário, a Sarkozy beneficia da abstenção à esquerda como Ségolène beneficia da abstenção à direita. À esquerda pode ainda um ou dois dos esquerdistas conseguirem apresentar-se e recolher os votos de todos quantos não o conseguiram. A escolha do esquerdista preferido torna-se muito fácil, e pode até gerar uma surpresa nos resultados. Há ainda um factor - não sendo especialista não sei se tem algum suporte empírico - mas pelo menos em teoria pode revelar-se um tiro no pé para Ségolène e/ou Sarkozy. Passo a explicar: se os "pequenos" candidatos não se apresentarem à primeira volta, e daí resultar a abstenção dos que neles pretendiam votar, o que acontece a esses votos na segunda volta? Dito de outra maneira, será que quem se absteve na primeira volta terá maior probabilidade de se abster? E será que quem optou por um voto de protesto na primeira volta opta por um voto realista na segunda? Se for este o caso, então a Sarkozy e Ségolène, interessar-lhes-ia viabilizar as "pequenas" candidaturas da sua área política para beneficiar do seu apoio à segunda volta, mas não é isso que estão a fazer.

Adenda: Le Pen admitiu hoje que ainda não ter os apdrinhamentos necessários para concorrer às eleições, e lançou um "apelo solene" (sic) aos eleitos para que o apoiem.

4 comments:

Hugo Mendes disse...

Em todas as sondagens o Sarkozy ganha, tanto na primeira como na segunda volta...O panorama não é nada famoso.

Zèd disse...

Ainda é cedo, digo eu, para sondagens. Os analistas políticos apregoam constantemente que há sempre supresas nas elições francesas, especialmente nas presidenciais. Parece-me que em França as sondagens tendem a influenciar o voto, talvez mais do que noutro lado qualquer, mas em sentido contrário. Os eleitores, talvez apenas os indecisos, parecem não gostar de vencedores anticipados. A ver vamos.

inu et neko disse...

Outra sondagem, hoje, revelava que 79% dos franceses pensam que nada esta feito ("rien n'est joué").
Por isso, se o cenario não é nada famoso hoje, pode mudar para melhor... ou para pior.
Victor

Zèd disse...

Eu não dizia que era muito cedo para sondagens? Hoje (21 Fev) saiu um sondagem no Le Parisien, da CSA, que dá uma ligeira vantagem a Ségolène. É a primeira vez nos últimos tempos. Bastou a Ségolène uma boa prestação na televisão, segunda-feira passada. Outro fenómeno a ter em conta é Bayrou, o candidato centrista, está em subida nas sondagens há já algum tempo. Será a surpresa destas eleições?