O post da Cláudia fez-me lembrar algo sobre o qual há muito estava para escrever (no "Véu da Ignorância") mas que acabei por nunca fazer; não lhe posso dar a devida atenção agora, mas fica a ideia essencial. Ao longo dos anos, muitos estudos têm dado forte solidez empírica à conclusão de que a heterogeneidade étnica é má para a aceitação pública de políticas redistributivas. Por outras palavras, as pessoas de um dado país aceitam tanto mais um Estado social generoso quanto mais os que são o seu público-alvo preferencial se assemelham a elas. Em lógica de soundbyte: "Solidariedade social, sim, mas com os que são como nós". A conclusão não é particularmente simpática para a esquerda, mas ajuda a explicar porque é que os países nórdicos - dos mais etnicamente homogéneos do mundo - tiveram uma expansão impressionante do Estado social ao longo do século XX, enquanto que os EUA se mantiveram como welfare laggard até hoje: o eleitor médio americano sempre soube perfeitamente quem era/é o mais provável beneficiário das políticas sociais federais e/ou estatais – a população negra.
Esta questão é central hoje, quando todos pensam o que fazer com o “modelo social europeu”. As incertezas aqui não radicam apenas na sustentabilidade económica dos diferentes regimes de protecção europeus (falar de um “modelo social europeu” já é em si falacioso, porque, empiricamente falado, há vários), mas também no modo como a simultaneamente justa – em nome do cosmopolitismo (e não do “multiculturalismo”!) – e inevitável – por questões demográficas e de crescimento económico – entrada de populações não-europeias no espaço da UE vai impactar na percepção das europeus no que toca à justiça e desejabilidade de um modelo social realmente generoso. Não sei se há dados (recentes) sobre Portugal sobre esta questão em particular; era interessante saber se o que pensam as pessoas sobre a justiça e desejabilidade dos mecanismos de protecção social se altera quando o seu público-alvo começar a contar com uma presença mais clara de ucranianos, romenos ou brasileiros.
domingo, 25 de fevereiro de 2007
"Solidariedade social, sim, mas com os que são como nós"
Posted by Hugo Mendes at 19:15
Labels: desigualdades sociais, Estado social, heterogeneidade social, imigração, modelo social europeu, União Europeia
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2 comments:
"o eleitor médio americano sempre soube perfeitamente quem era/é o mais provável beneficiário das políticas sociais federais e/ou estatais – a população negra."
E hispânica também. Não esquecer.
Sim, Luís, é verdade, estava apenas a pensar mais em termos históricos do que no passado recente.
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