A pergunta é perfeitamente pertinente (feita ali): "E, afinal, Hugo, o que é que a sociologia francesa já nos deu?". Eu bem gostaria de saber. Refira-se que quem fez a pergunta acha isto.
Ora ultimamente escreveu-se muito sobre Baudrillard, que eu na minha ignorância desconhecia por completo, mas quando vejo este vídeo (postado aqui) fico inquieto. É que pela amostra junta fico com a ideia - perdoe-se-me a provocação desnecessária e gratuita, e ainda para mais o senhor morreu há tão pouco tempo, mas hoje estou um nadinha pr'o iconoclasta - que se trata do campo da Filosofia (e quem diz Filosofia diz Sociologia, ou Antropologia, ou Ciências Sociais, ou as Ciências simplesmente) que eu menos aprecio: a masturbação intelectual.
Ora ultimamente escreveu-se muito sobre Baudrillard, que eu na minha ignorância desconhecia por completo, mas quando vejo este vídeo (postado aqui) fico inquieto. É que pela amostra junta fico com a ideia - perdoe-se-me a provocação desnecessária e gratuita, e ainda para mais o senhor morreu há tão pouco tempo, mas hoje estou um nadinha pr'o iconoclasta - que se trata do campo da Filosofia (e quem diz Filosofia diz Sociologia, ou Antropologia, ou Ciências Sociais, ou as Ciências simplesmente) que eu menos aprecio: a masturbação intelectual.
16 comments:
Cuidado com as generalizações !!
O Baudrillard não representa bem a sociologia francesa tal como eu e o Hugo, acho, a concebemos. Ele não fazia trabalho de campo, inquéritos. De facto era mais um exercicio de filosofia baseado em intuições mais ao menos pertinentes.
Para uma critica do Baudrillard feita pelo um sociologo, podes ler isso http://www.lemonde.fr/web/article/0,1-0@2-3232,36-884398,0.html
Victor,
Não é uma generalização, é apenas a respeito da peça que refiro, ou quando muito em relação ao Baudrillard.
"De facto era mais um exercicio de filosofia baseado em intuições mais ao menos pertinentes." , isso era o que eu temia...
Obrigado pelo link
Estou muito ofendida por não haver um marcador para "antropologia".
Mas, além da masturbação intelectual, do Bourdieu e o do Baudrillard...?
Vá lá, oh Fuckitall, comparar a "masturbação intelectual" do Bourdieu com a do Baudrillard é como comparar, no campo da antropologia, a do Marshall Sahllins com a do Mircea Eliade.
Renato, eu gosto do Baudrillard da economia política, a dos "loucos anos seventies". Mas o Baudrillard dos anos 80 cortou completamente com essa linha e, para todos os efeitos, para tudo o que vinha do marxismo. Acho que hoje os admiradores de Baudrillard - como aliás o próprio - não se reconhecem minimamente nesse trabalho que começa com a "Sociedade de Consumo" e acaba basicamente com a questão da troca simbólica e da morte. E mesmo aqui suponho que muitas das coisas que tinha para dizer são mais relevantes para a antropologia do que para a sociologia.
Isto para dizer que discordo que ele seja uma referência para a sociologia :)
"Em última instância toda a teoria é especulativa. Parece-me redutor definir a sociologia a partir da sua base metodológica ou empírica."
Eu acho que toda a ciência tem uma componente especulativa, mas não é esse o problema, a ciência não se pode contentar de ser APENAS especulativa, correndo o risco de se transformar em onanismo intelectual (onanismo é mais bonito, não é?). Transforma-se num exercicio auto-justificado completamente desligado da realidade.
fuckitall, pensei que Antropologia estivesse contida na tag Ciências Sociais (espero que isto não seja considerado uma provocação), não tive a intensão de ofender a Antropologia, isse fica para outro post, uma ofensa de cada vez.
Eu não acho que o Baudrillard pretendesse ser ou quisesse ser reconhecido como "cientista". Por isso acho que a ligação à sociologia ou a outras ciencias sociais, em particular depois do inicio dos anos 80, não ajuda a perceber o seu trabalho, que se enquadra muito mais na especulação filosófica.
Claro, Hugo, estava a contar as três coisas como contribuições separadas. Mas agora penso que, em bom rigor, a masturbação intelectual é um contributo dos franceses em geral, não dos sociólogos em particular. Retiro.
Então, recapitulando: além do Comte, do Durkheim e do Bourdieu, do Baudrillard, do Boltanski, do Thévenot e do Latour, do Singly e, já agora, do J-C Kauffman, o que é que a sociologia francesa já nos deu?
O Foucault não conta como sociólogo, pois não?
(Homem, nem me passaria pela cabeça pôr à séria o Bourdieu no mesmo saco com o Baudrillard. Até porque o Bourdieu é um bocado antropólogo.)
Zed: a antropologia não está contida nas ciências sociais, as ciências sociais é que estão contidas na antropologia :P
"Então, recapitulando: além do Comte, do Durkheim e do Bourdieu, do Baudrillard, do Boltanski, do Thévenot e do Latour, do Singly e, já agora, do J-C Kauffman, o que é que a sociologia francesa já nos deu?"
É engraçado que criticas os tiques de autor - que depois podem degenerar na masturbação intelectual - da sociologia francesa e depois apenas imaginas que as contribuições possam apenas estar independentes dos trabalhos das escolas de autor (esqueceste-te, já agora, do Boudon, do Touraine, do Crozier, e dos seus alunos ao longo do tempo, e mais recentemente dos trabalhos do Latour, Lahire, etc. etc.). Do ponto de vista dos ensinamentos que podemos retirar, é mais interessante, como já referi num outro comentário a um outro post, ver as coisas por áreas: escola, trabalho, organizaçoes, protecção social, movimentos sociais, família, media, etc.
Deste ponto de vista, o rigor, a cumulatividade empírica e aquilo que realmente "ficámos a saber mais" do que no passado é muito mais passível de ser verificado do que se continuarmos a ver a sociologia francesa como uma guerra de autores e personalidades, que é infelizmente o mito que os que não gostam dela muitas vezes propagam. É óbvio que essas guerras existem, mas os ensinamentos que retiramos dos trabalhos nas diferentes áreas de estudo são muito mais importantes e fundamentalmente irredutíveis aos choques pessoais e institucionais em causa (dos quais, aliás, gosto bastante, porque nos ensinam de ondem emergem os interesses e os estudos, mas isso é outra conversa).
Desculpa, não vi que tinhas listado o Latour lá atrás :)
O Foucault pode contar como sociólogo, não vejo porque não. O Bourdieu e o Foucault têm imensos pontos de contacto, e por vezes de sobreposição. Mas duvido que ele se reconhecesse nesse universo das "ciências humanas"; e muitos sociólogos não lhe perdoam o facto de, na guerra entre a filosofia e as ciências himanas/sociais, ele nunca ter defendido estas contra a primeira, e ter sempre preferido o radicalismo do seu pensamento contra o rigor da empiria. E, a bem ver - ao contrário do Baudrillard, que se estava a marimbar para a empiria -, muitas das teses do Foucault dependem de uma "historical accuracy" que ele nunca levou a sério.
"já agora, do J-C Kauffman"
Eh pá, o J-C Kauffman às vezes cai um bocado para aquilo que chamo de "sociologia de cabeceira", e no caso dele, num sentido bastante literal. Mas confesso: antes do J-C Kauffman que o Baudrillard.
Renato, estou totalmente de acordo, mas aí a questão nesse caso é apenas entre boa ciência ou má ciência, e é como em tudo, pode haver boa e má. Nem a especulação é sempre má, nem sempre a análise empírica é boa. O problema do onanismo intelectual é que geralmente é inútil, quando não fraudolento.
fuckitall: é verdade as Ciências Sociais é que fazem parte da Antropologia, tal como a Antropologia faz parte da Biologia.
Sim, e é verdade que o apreço dos franceses pela masturbação intelectual não se limita à Sociologia (sem querer entrar em generalizações abusivas...).
Bolas, zed, apanhaste-me! Ou disso ou da filosofia.
Hugo, eu aqui não critico nada (quem falou na masturbação intelectual foi o zed, na verdade). Eu disparato. Há uma diferença.
Mas se queres falar a sério, o ponto do sketch dos Monty era, justamente, que criticamos muito as coisas de que estamos mais próximos e que nos fizeram pensar. A sociologia francesa, por exemplo. E estava a citar nomes porque a conversa partiu de um (o Baudrillard), a que achei alguma piada no princípio do curso, há muitos, muitos anos (irra, agora reparo: há quase 20!).
Aaaaargh, há que tempos não me lembrava do Boudon! Estás a trazer traumas de infância ao de cima, espero que haja por aí psicoterapeutas para quando esta conversa acabar.
psicoterapeutas não sei.. mas aqui vai um site que talvez possa ajudar qualquer coisa.. http://www.professorkaramba.eol.pt/
P.S.
Acho o Baudrillard um teórico importante àcerca do poder da imagem
Tem pelo menos aquele mérito que têm as reflexões seminais: "semeou" ideias, perguntas, temas. E já não é pouco.
Para pegar na expressão do Hugo, a especulação filosófica também é parte do trabalho científico. Como o são as recolhas quantitativas muito bem escoradas metodologicamente, como o são também as leituras qualitativas como as faz o Kauffman. Não vejo doutra forma a construção do conhecimento nas ciências sociais (para não sair destas), pela interacção destas três vertentes, que se vão alimentando/provocando/questionando umas às outras. A maior parte dos autores não faz mais do que uma destas coisas, mas isso não lhes tira validade, pelo motivo que apontaste, Hugo: o trabalho científico é, nos resultados, um trabalho colectivo. Mesmo que no quotidiano pareça que é uma soma de visões individuais conflituantes. Ou por isso mesmo.
(pronto, já conseguiram pôr-me a falar a sério, espero que estejam muito contentes, grumpf)
Enviar um comentário