quarta-feira, 14 de março de 2007

O drama de Le Pen

O drama de Le Pen não será o de recolher os apadrinhamentos necessários para se candidatar às eleições presidenciais, ao que parece estas estão asseguradas e Sarkozy já demonstrou querer, se necessário, ajudar Le Pen obtê-las. O drama de Le Pen é, paradoxalmente, ter chegado à segunda volta nas eleições de 2002, e tê-lo conseguido com um resultado que põe ao mesmo tempo a fasquia demasiado alta e demasiado baixa. Demasiado alta para ser uma alternativa de poder, e demasiado baixa para ser um partido de protesto anti-sistema. Por um lado chegar à segunda volta foi o melhor resultado que Le Pen podia atingir, a partir daí já não pode subir mais, ora um dos grandes trunfos de Le Pen e da Frente Nacional foi até aqui a sua subida constante, lenta mas sólida, ao longo de mais de vinte anos. Ao chegar à segunda volta o passo seguinte é ganhar as eleições, para isso tem que apresentar um programa o que é incompatível com a sua natureza anti-sistema. As poucas e ambíguas tentativas da FN, e em particular com Marine Le Pen, filha de Jean-Marie Le Pen, e sua putativa sucessora, deixam expostas as fragilidades do partido: por um lado as suas propostas não são muito consistentes, por outro nem são assim tão diferentes das dos partidos de direita do "sistema". Por outro lado, "grande azar" de Le Pen foi o de ter como adversário à segunda volta Jacques Chirac, do ponte de vista de Le Pen não podia ser pior, Chirac conseguiu congregar os votos de todo o espectro político fora a extrema-direita. Se por hipótese o opositor tivera sido o socialista Jospin (o que não esteve assim tão longe de acontecer) Le Pen teria tido provavelmente uma votação muito superior aos 18% que teve contra Chirac, eu arriscaria qualquer coisa na ordem dos 30%. Teria sido um terramoto ainda maior à segunda volta do que foi a primeira. Com 30% dos votos Le Pen ter-se-ia tornado incontornável, e a FN teria a sua legitimação como partido integrante do sistema político francês. Aliás há pouco tempo um documentário televisivo revelou imagens de Le Pen pouco depois de receber a notícia de que tinha passado à segunda volta contra Chirac, e a sua expressão, contrariamente ao que seria de esperar por parte do vencedor surpresa dessa noite eleitoral, era uma cara de poucos amigos. No final de contas o melhor resultado que Le Pen poderia alguma vez alcançar tornou-se no pior resultado possível dadas as circunstâncias.
Arriscando um bocado de futurologia, este ano se não conseguir melhor do que conseguiu há cinco anos Le Pen está em maus lençóis. É impossível - tanto quanto há impossíveis em política - conseguir sequer igualar o feito de 2002. Segundo as sondagens, Le Pen não só não passa à segunda volta, não obtém o mesmo nível de votação, como nem sequer será o terceiro candidato mais votado, será provavelmente o quarto. A partir daqui parece-me improvável que a FN venha a subir no futuro, vai deixar de representar a franja dos descontentes, dos votos de protesto. Isto não quer dizer que Le Pen e a FN vão desaparecer do mapa político de um momento para o outro, o seu eleitorado é muito enraizado regionalmente e socio-economicamente, mas vai provavelmente definhar lentamente. Fica por saber para onde irão os votos, porque o eleitorado de extrema-direita existe e vai continuar a existir.

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